O Poder do corte nas Telas - A regra dos seis de Walter Murch

WALTER MURCH | NUM PISCAR DE OLHOS | SONHOS | CORTES | CINEMA | ROULES OF SIX

Tempo de Leitura: 10min 16sec

Qual seria a ferramenta mais importante na hora de se contar uma história? Qual seria o método chave e o que  desconsiderar na hora da edição antes de apresentar um produto final  que funcione? 

Walter Murch se propôs a  responder  essa e outras perguntas em seu livro, mais conhecido como a bíblia do editor, Num Piscar de Olhos, no livro ele analisa a relação entre corte, continuidade, a brutalidade do corte em paralelo ao sonho e  o piscar de olhos.

Walter Murch 

Walter  trabalhou nos  filmes: O Poderoso Chefão, O Mundo Fantástico de Oz, Apocalipse Now entre outros. Murch é um excelente profissional, atuando em diversos departamentos no campo audiovisual indo da sala de edição á direção de longas.

Seu livro num piscar de olhos é onde evidencia seus conhecimentos em diversos setores. Murch fala sobre mixagem de áudio e a evolução da edição e suas ferramentas. Somos levados por ele a conhecer os desafios da edição através dos seus trabalhos usando-os para exemplificar, esse método deixa o livro ainda mais interessante. Sem dúvida há uma entrega muito grande por parte dele para que a edição seja vista como parte fundamental na hora de se contar uma história.

A noção de dirigir um filme é a invenção dos críticos - toda a eloquência do cinema é alcançada na sala de edição.

– Walter Murch

Num Piscar de Olhos- A Obra 

A teoria levantada pelo autor surgiu através de uma percepção de uma ocorrência comum, seus cortes  estavam sendo feitos antes dos personagens piscarem. Murch queria entender o porquê do ato de piscar influenciar seu trabalho na edição. Em John Houston  estava a resposta e uma frase dele mudou tudo "O filme é como um pensamento. De todas as artes, é a mais próxima do processo de pensar."

O que Houston sugeriu é que o piscar é um mecanismo fisiológico que interrompe a aparente continuidade visual de nossa percepção. Nossos olhos  capturam e fragmentam imagens e organiza de maneira sequencial lógica. O Piscar é o corte, é a interrupção. 

Murch teoriza a relação entre filmes e sonhos além do piscar e a mudança no estado de espírito das pessoas durante o processo, colocando que o piscar é muito mais do que apenas uma necessidade de umedecer os olhos e está mais relacionada com o poder das emoções e o pensamento.

O Corte

Cortar é mais que excluir cenas ruins, é perceber como uma cena se identifica com a história e como uma cena pode influenciar a narrativa que está sendo tecida. A magia da edição está em trazer uma certa verdade com as cenas presentes, um mistério com os cortes certos, uma evolução com o conjunto, um filme  é um retalho que precisa de um equilíbrio. Cada sim e cada não precisam ser ditos com base em uma influência positiva para que a obra funcione. 

Cortar é mais que um método conveniente de tornar contínua a descontinuidade. 

É em si, pela força de sua paradoxal subitaneidade, uma influência positiva na criação de um filme.”

- Walter Murch

A Magia da Edição 

A função da edição é preservar um fluxo lógico, um filme é um retalho de cenas e essas cenas precisam se encaixar para fazer sentido, não podem ser uma mudança brusca sem coerência, pois isso desestabilizaria o público perdendo o foco principal a emoção, o público é capturado por esse fator. 

Além da emoção, Murch acrescenta 5 critérios que devem ser considerados na hora da edição. Roules of Six ou as Seis Regras da Edição, é um conjunto de regras usado por Murch para poder nortear qual decisão tomar na hora do corte. 

O corte ideal para Murch obedece aos seguintes critérios: 1-Reflete a emoção do momento; 2- faz o enredo avançar; 3- acontece no momento "certo", dá  ritmo; 4- respeita o que se chama de Eye Trace ou "linha do olhar", que é a preocupação com o foco de interesse do espectador e sua movimentação dentro do quadro; 5- respeita a "planaridade"  a gramática das três dimensões transpostas para duas  pela fotografia; 6- respeita a continuidade tridimensional do próprio espaço (relação entre a posição das personagens em cena e o espaço). 

De forma objetiva, os critérios estabelecidos por Murch e sua porcentagem são:

★  Emoção........................................51%

★  Enredo.........................................23%

★  Ritmo...........................................10%

★  Eye Trace....................................7%

★  Plano Bidimensional da tela........5%

★  Plano Tridimensional da ação......4%

De todos os que se devem preservar a qualquer custo, é a emoção, por isso ela se encontra com 51% e no topo da lista. Se bem que o próprio Murch fala sobre a imprecisão do uso das porcentagens alegando que elas existem apenas para demonstrar quem é o maior denominador na equação.

É necessário falar que a emoção, enredo e ritmo estão interligadas, pois, se teve uma emoção adequada, o enredo andou e então se teve um bom ritmo. O que ele sugere é que nunca, nunca abra mão da emoção.

Se tiver de abrir mão de alguma coisa, nunca abra mão da emoção em benefício do enredo. Não abra mão do enredo em benefício do ritmo, não abra mão do ritmo em benefício do alvo da imagem, não abra mão da dimensão dos planos em benefício da continuidade.

Entendendo melhor os critérios:

Para conhecermos cada um dos critérios decidi dividir em dois grupos assim como ele trabalhou no livro, destacando os três pontos mais importantes (Emoção, enredo e ritmo)   e os três que podem ser sacrificados e de importância mínima(Eye trace e os planos).

Grupo Principal

1. Emoção

Tido como o elemento mais importante, todos os cortes devem priorizar a linha emotiva, quer que seja ela, para manter a imersão do público.

Se a linha traçada num primeiro momento for de tristeza, todos os elementos presentes precisam evidenciar essa tristeza, se as cenas escolhidas afetarem negativamente mudando o foco, deve  ser repensada. Lembrando que entre todos os critérios, está é a única que não se deve abrir mão, nunca!

2. Enredo

Nesse ponto a pergunta que se deve fazer é: as cenas escolhidas fazem com que o expectador compreenda a história? 

Todas as cenas devem ser bem amarradas e ajudar a contar a história, cenas que não ajudam a tecer a história ou mudar o sentido narrativo pode e devem ser cortados.  

3. Ritmo 

Seria a sequência regular de sons e movimento. 

O ritmo também leva o espectador a provar emoções existindo dois tipos, longo e o curto. Uma  sequência com muitos cortes e com um plano de menor tempo deixa claro uma euforia, agitação e até mesmo desespero, enquanto um plano mais longo e com menos cortes trazem leveza, calma e contemplação. 

Grupo Secundário

4. Eye Trace

É o que garante a atenção do público, "eye trace" é a linha do olhar, o ponto de foco do público. Os cortes devem considerar o ponto em que estará a atenção de quem assistirá às cenas. Aqui também é necessário certo cuidado para não haver cortes bruscos que influenciem na narrativa prejudicando a compreensão, pois o público busca pontos nas cenas que lhes permite ter a ideia do que está ocorrendo. 

5.Plano Bidimensional da Tela

O plano bidimensional ou planaridade está ligado ao conceito de ângulo e claro a linha do olhar. Os acontecimentos em cena aqui são muito destacados.  É aqui onde objetos e espaços recebem atenção maior e precisam obedecer a uma sequência lógica eficaz na hora dos cortes para que o espectador receba com naturalidade o movimento e mudança. 

6. Plano Tridimensional da Ação

Seu conceito se assemelha ao da planaridade, alterando apenas que a anterior é em 2D e esta é 3D. Comumente conhecida também como continuidade espacial, é nela que são abordadas todas as questões ligadas a tridimensionalidade a continuidade de uma cena em amplo espaço.

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Fontes:

Murch, Walter. Num Piscar de Olhos. Rio de Janeiro ed.2004. Tradução de: In the blink an eye.

Link. https://www.avmakers.com.br/blog/classico-dos-classicos-6-regras-de-corte-de-walter-murch